terça-feira, 31 de agosto de 2010

Celular


Eram seis da manhã quando me dirigi ao ponto de ônibus da minha rua para ir ao trabalho, não esperei muito, mas como nada é perfeito, o ônibus estava lotado. O ponto já estava cheio quando cheguei então fui um dos últimos a entrar, mas quando faltava apenas umas duas pessoas subirem para eu finamente embarcar, notei que uma mulher ruiva, bem vestida, deixou seu celular cair, foi uma daquelas horas em que os segundos passam mais rápidos por mais que quiséssemos que passassem da forma mais lenta possível, parei, esperei a pessoa que estava a minha frente subir, nisso deu tempo de pensar em todas as atitudes cabíveis, porem sem ter coragem de decidir nenhuma. Por mais rápido que os segundos passassem, vi as coisas ao meu redor acontecendo em uma velocidade incrivelmente lenta, de forma que não é exagero dizer que entrei na velocidade dos meus próprios pensamentos, entretanto a única coisa que pude reparar na mulher, que estava de costas, foi os cabelos ruivos e um andar suave, quando me dei conta de que teria que embarcar, dei um salto em direção ao celular, o peguei, e tentei chamá-la com "psiu's", mas ela não me ouviu, como estava em cima da hora, embarquei, guardei o celular em minha pasta, e fiquei pensando sobre como encontrá-la, passei praticamente a viagem inteira pensando nisso, só percebi que estava fora de mim quando o ônibus parou, havia chagado ao terminal, me dirigi na fila para o próximo ônibus que deveria pegar, confesso que nesse trajeto também me distrai, a prova é que não me lembro nem se quer de como fui do desembarque até a fila do outro, não me lembro do trajeto, esqueci até de comprar meu jornal, lembro-me de alguém tentando chamar minha atenção, deve ter sido inclusive o vendedor, mas o ignorei, um pouco por não querer me desviar dos meus pensamentos, ou por estar submerso nos mesmos, a única lembrança que tenho, desse momento, foi de quando meu ônibus veio e me apressei para subir o mais rápido possível, queria sentar e saber mais sobre a "misteriosa mulher ruiva", tentei sentar em uma das cadeiras individuais, mas estavam todas ocupadas, então sentei na cadeira da janela, e da ultima fileira, peguei então minha pasta, com a ansiedade que é típica dos curiosos, peguei o celular na mão, mas fiquei olhando ele, me faltou a coragem para desbloquear o teclado e começar a explorá-lo,"não seria uma invasão a privacidade da pessoa?""será que isso é de fato correto?" foram essas as perguntas que a observação gerou. Após um tempo pensando nas respostas, abandonei a idéia da exploração, apenas olhei os contatos: Mamãe, Casa, Papai, etc. Minhas primeiras conclusões foram de se tratar de uma mulher bastante caseira, ou familiar, se não for nenhuma das duas, pelo menos tem um grande afeto pela família, caso contrário não teria escrito "Mamãe", teria simplesmente colocado "Mãe", ou talvez eu estivesse ficando louco com os pensamentos, mas de fato mamãe é um tratamento mais carinhoso que mãe, porem duvidei da teoria, se tratando dos dias atuais, não é uma coisa comum uma jovem de vinte á vinte e cinco anos, ter um tratamento tão carinhoso com os pais, quem sabe trata-se de uma garota diferente, fiquei uns minutos imaginando o perfil dela, mas um quebra mola quebrou minha linha de raciocínio, e então voltei a realidade e tentei ligar para o contato Casa, chamou, e ninguém atendeu, nesse momento já estava próximo da empresa, pensei em deixar de lado essa historia e me concentrar nos assuntos profissionais.
Sai do trabalho as sete da noite, assim que entrei no ônibus fiz o mesmo trajeto, procurei as cadeiras individuais, sentei em uma que estava vaga, e peguei o celular, tentei telefonar para "Casa" novamente, mas ninguém atendeu, enquanto o telefone chamava, em minha mente estava  pensamento de como seria a voz, os traços do rosto, o perfil, e foi nesse instante que a curiosidade voltou a tona," Ora, posso saber tudo o que quero, basta olhar", foi o pensamento mais irresistível que tive até hoje, e por mais que a ética não me permitisse, o bloqueio não me parou, fui capaz de tira-lo e ir o mais rápido possível para as mensagens, mas assim que entrei o celular tocou, era uma mensagem chagando, dizia "Olha, acabei de ficar sabendo que vai haver um show semana que vem, que tal?", "será que ela tem namorado? Mas a final o que isso me importa?", tentei me distrair me focando nas outras mensagens:"Foi muito bom ontem, poderíamos marcar novamente", "como assim? de fato ela tem namorado!", mas não entendi por que me decepcionei, fiquei me questionando mas sem chegar em uma resposta concreta, tentei buscar mais traços do perfil, nenhum lugar melhor que nas fotos, tinham fotos de paisagem, e grupos de amigos, fotos em teatros, com livros também, a maioria em bibliotecas e com amigos, bem parece ser uma pessoa que gosta de sair, principalmente com os amigos, e bem culta, com um jeito diferente de se ver, admito que fiquei bastante curioso quanto a isso, quanto a profissão, me sugeri bibliotecária, professora, ou atriz, o que justificaria as viagens com o elenco para peças e as fotos em frente aos teatros, depois dessas deduções, migrei para as musicas, e fiquei bestificado quando vi Beatles, Legião, e bandas tão incomuns nos ouvidos de outras jovens da mesma idade," Com certeza ela é diferente", todas as conclusões me fizeram pensar, decidi então procurá-la e devolver o celular, mas não só isso, se possível conhecê-la de fato, nesse momento já havia chegado em casa, como o próximo dia era sábado, preferi dormir e descansar e depois começar a busca, infelizmente o descanso não foi possível, não dormi nem relaxei, cheguei a me levantar a meia noite somente para saciar a vontade de descobrir que era a "mulher misteriosa", as a sensatez me pôs de volta a realidade, do mesmo jeito, contei os minutos, quando deu nove e meia da manhã, sai em busca dela, como já estava pronto desde as seis, apenas sai, fui até onde a vi pela ultima vez,  da li tentei ligar para ela, e ela atendeu:
-Alô! Alô?- fiquei sem palavras durante alguns segundos
-Oi!
-Quem fala?
-É o Miguel, é que você deixou cai seu celular, ontem, e gostaria de te entregar!
-A sim claro!
-Você pode me falar seu endereço, eu vou até ai!
-Tudo bem, mas onde você está?
-Exatamente no ponto em que você perdeu o celular!
-Ah! Vire a esquerda e siga em frente, estarei te esperando! Tchau!
-Tchau! - A cada passo a adrenalina subia, o coração apertava até que, lá estava ela, seu rosto com traços suaves como o seu caminhar, e os olhos claros, simplesmente nada menos do que linda!
-Oi - Eu falei
-Oi - Ficamos nos olhando durante um tempo, até que eu voltei a mim
-Ah! Aqui está seu celular!
-Muito obrigada, obrigada mesmo!Bem eu tenho que fazer umas coisas em casa então...
-Tudo bem, até mais!
-Até!- O nervosismo foi tanto que não consegui pronunciar as frases que queria, ficaram presas na garganta, lá se alojaram e não quiseram sair, de qualquer forma, não tinha coragem de voltar lá, então esperei atenciosamente a segunda feira, na expectativa de encontrá-la descendo do ônibus novamente, e que se possível seu celular caísse, mas a segunda veio, e outras segundas também vieram, mas ela não veio, mesmo assim até hoje espero ela no ponto, as vezes passo em frente a casa dela varias vezes, e nem sinal dela, isso me fez questionar se tudo não passou de um sonho, mas se de fato foi sonho, foi o sonho.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Saudade

Sentado no sofá, vendo um programa de televisão ao qual não me recordo, em uma manhã de domingo, e aqueles pensamentos que surgem como se tivessem vida própria, que de fato tem pois surgem do nada e tomam conta de todos os sentidos de forma sobre natural, tomaram conta de mim, talvez essa seja a causa de não me recordar do programa, lembrei dos tempos de infância, e de tudo que fez dos primeiros 18 anos de vida infinitos, todos os turbilhões de historias infantis me fizeram rir sozinho, olhar para o nada como se ali existisse um novo mundo, que existia realmente ou que existiu. Veio-me a mente todas as pessoas, a escola, e eis aqui mais um fato que me faz crer que esses pensamentos têm vida própria, perdi o total controle do meu próprio corpo, e fui levado pelas minhas pernas, controladas pelas lembranças, penso até hoje em como elas me conduziram perfeitamente até um aposento que fiz de biblioteca, pararam exatamente enfrente a um baú, que não mexia a muitos anos, lembro-me que no momento fiquei pasmo com os movimentos realizados pelas minhas reminiscências , mas mesmo que estivesse em controle de mim, acredito que não iria acertar o que viria a encontrar no baú. Após um tempo de raciocínio em frente ao baú, respondendo aos "como's" e "por que's", como que se fosse cronometrado, no momento exato que achei que havia encontrado a resposta, meus braços puseram-se a me revelar o segredo, não o de como as pernas tinham me levado, pois, quanto a isso me geraram mais espanto, mas sobre o que estava dentro do baú que era tão importante no momento, quando abri, não pude ver o que era de fato pela poeira que o cobria, era algo como um livro, passei a mão para tirar a camada de sujeira que estava por cima, vi então que se tratava de um álbum de fotografias, diga-se de passagem, tão antigo quanto o dono. Olhando as fotografias, as lembranças se firmaram, e as revoluções do corpo também, descobri que os órgãos, que achava ainda poder controlar, me traíram, primeiro foi o coração, ao se contrair e aumentar ao mesmo tempo, querendo sair pela boca, e na foto da turma da oitava serie inteira reunida, meus olhos se juntaram ao grupo de rebeldes, deixando escapar uma lagrima, na verdade a primeira das outras que vieram, e tomaram meu rosto da sensação mais indescritível, a ela, a rebelião, aos movimentos, a perda dos sentidos, dei o nome de saudade, e como se não basta-se as fotos e as lembranças encharcando meu peito, ao final do álbum havia uma lista de assinaturas e o telefone de todos, as assinaturas me trouxeram mais recordações, e vendo os números, junto com a saudade , me deu a vontade de tentar numero por numero, até que pude-se encontrar uma voz amigável, e que pergunta-se " tudo bem com você?" ou talvez falasse " há quanto tempo", seria o bastante para provar que ainda sou vivo na memória dessas pessoas, assim como elas são nas minha, mas me faltaram as forças necessárias e um motivo maior, não que o proposto antes fosse fútil, mas era muito egoísta, ligar pelo prazer de descobrir se é importante para uma pessoa, claro que também me importo com como têm passado, mas acho que seria mais uma forma de alimentar meu ego, o fato é que foram os únicos amigos que tive. Tomando o controle do meu corpo novamente, voltei ao sofá e refleti sobre como estariam no momento, se estariam bem, mas acabei da mesma forma não ligando, se pudesse ao menos voltar no momento e refletir sobre a forma que pensei, não teria deixado de ligar, agora vejo que não é pecado algum saber se você foi importante na vida das pessoas que fora importantes para você, e que não seria egoísmo ligar, pois o verdadeiro motivo da ligação estava sobre qualquer tipo de pensamento egoísta, meu motivo era superior, foi o mesmo que me fez chorar, e que me fez perder meu domínio, meu motivo era o mais sincero, era a saudade.

Formatura

     Acho que a ultima coisa que a gente presta atenção quando está sentado em uma cadeira de ônibus, olhando pela janela, é na paisagem, surgem pensamentos que você nem sabia que existiam em você, ou que até mesmo você nem achava que os cabiam dentro de uma única pessoa. Nessa volta para casa, depois de um dia um tanto cansativo, meus pensamentos tinham um foco, não eram as paisagens, que eram bonitas, mas em um final de ano, e você em pleno terceiro ano, as paisagens não se tornam tão atrativas quanto os detalhes da formatura, mas também não foi esse o foco de meus pensamentos, eles se baseavam em algo que tomava, já a um tempo, não só os próprios pensamentos, mas meu coração, se você considerou essa passagem brega, ou qualquer coisa semelhante, acho que nunca esteve apaixonado de verdade, e se fores ler para continuar zombando das coisas que me aconteceram, simplesmente digo para que pare, isso não te fortalecerá em nada.
    Minha formatura de certa forma me incomodava, mas não se tratando de ansiedade ou dos preparativos, ia mais além, e essa preocupação tinha um nome: Luana. Muitos podem dizer que não deveria ter perdido meu tempo escutando o desenrolar da historia, porém todo tempo e bem gasto quando se tem o desejo de querer revive-lo. Bem boa parte da historia vocês já conhecem, pois foi como um filme, tem sempre um garoto tímido que nunca consegue falar com a garota, isso parece até dar um tom de comédia, mas diferentemente dos filmes, eu não gaguejava ao falar com ela, nós por umas dez vezes passamos o intervalo conversando, foram as melhores conversas, afirmo isso com total certeza, a justificativa e anotar a historia, depois de tantos anos, com a mesma conclusão, mas não escrevo para relembrar, isso seria poder esquecer, escrevo para reviver as emoções. Ela me considerava um amigo, ou um companheiro de conversas, sei que nosso relacionamento era estreito, esse foi o grande desafio, como romper essa barreira? E já no final do ano, era tudo ou nada, mas o tempo foi passando e os dias também, e a idéia permanecia junto com a inércia, por que é tão difícil falar para pessoa que se gosta a verdade? Mas como o tempo não para, a formatura chegou, agora realmente era tudo ou nada, apostei tudo o que podia e o que tinha, fui ao seu encontro na festa, chamei para uma área mais afastada do cerimonial, era um jardim com rosas, orquídeas, tulipas, lembro-me de todos os detalhes, a fontes ao centro com a imagem de um anjo, foi onde sentamos, e conversamos durante 30 minutos sobre assuntos supérfluos e planos para o futuro, depois desse tempo, eu não sei como, encontrei dentro de mim as forças necessárias para dizer:
-Luana, bem... faz tempo que estudamos juntos - minhas mão transpiravam e eu tremia – e...bem ...eu gosto de você! Varias palavras me vieram a mente mas ficaram retidas na garganta, lembro que nos primeiros minutos, olhávamos um nos olhas do outro, foi quando finalmente reparei em seus olhos, azuis lindos como o mar, e tentar descrevê-los com palavras é covardia com a língua portuguesa, que não possui palavras com tamanho significado, depois ela olhou para o chão, um silencio subiu, na hora me arrependi de cada palavra, mas ela se ergueu:
-Rodrigo, também gosto de você – nesse momento meu coração chegou a sair pela boca – mas...vou me mudar para outro pais, e já estava pensando, faz tempo, em como te esquecer, e agora isso!
-Não pense, vamos fazer desse tempo infinito!
Ela segurou em minha mão, limpou uma lágrima que corria sobre seu rosto, aceitou o meu convite, e andamos a madrugada sob a luz do luar, conversando sobre o tem pó perdido, no final do nosso encontro nos beijamos, e foi a primeira vez que desejei uma coisa tão profundamente: Que de fato aquele momento fosse infinito. Mas as horas passaram, e eu não desejaria que passassem de outra forma, ela teve que ir, mas tem algo dela que eu guardo até hoje, é meio estranho confesso, mas elas rasgou uma parte do vestido para me dar, já que não havia nada para deixar-me de lembrança, no meu peito surgiu um turbilhão de sentimentos variados, nos despedimos, e não havia nada a se dizer, o silêncio acabou falando por nós, depois da li nossas vidas se seguiram, e hoje em dia a saudade e eu, freqüentamos o lugar, onde foi a minha descoberta de o que significa verdadeiro amor.